“Se você quer construir um navio, não chame as pessoas para  juntar madeira ou atribua-lhes tarefas e trabalho, mas sim ensine-as a desejar a infinita imensidão do oceano.”

Saint Exupéry

Propósito ou legado não eram palavras faladas no mundo empresarial até bem pouco tempo, porque isso não era uma “questão”. Trabalhar era uma obrigação social, um padecimento aceitável, um meio de se conseguir chegar ao que realmente importava, que era o tempo livre. Hoje em dia, porém, propósito e legado são temas centrais nas reflexões dos executivos, basta ver o número de artigos e livros sobre isso.

Mas qual a razão deste interesse? Provavelmente, o encontro de duas gerações distintas no ambiente laboral: as assim chamadas geração X e Y. De um lado, a geração Y insistentemente cobra prazer no trabalho. Tudo precisa ser lúdico, prazeroso. Todo esforço parece insuportável. De outro lado, os da geração X, com outra forma de pensar e em outra fase da vida, compreendem que trabalho é esforço. Uma fórmula deveria fazer a mediação entre estas duas posturas:

Trabalho sem prazer não dá,

Trabalho só prazer não há.

Como conciliar? Quando fazemos algo em que percebemos o propósito, conseguimos ver o produto final, gostar dele, e para atingi-lo somos capazes de superar obstáculos, enfrentar problemas, encarar desafios. Se não compreendemos o propósito de nosso trabalho, qualquer esforço é uma tortura.

A compartimentação das tarefas faz com que o trabalhador muitas vezes não se reconheça no que produz. São tantas as pessoas envolvidas, tamanha a complexidade dos sistemas e tal a facilidade da empresa em dispensar seus funcionários que uma pessoa não se envolve com seu trabalho nem percebe de que forma ele colabora  para o resultado final. Isso gera uma postura de alienação, ou seja, eu não me reconheço naquilo que faço.  Meu trabalho não é minha obra.

Esta postura “de gavetas” é herdada da estrutura fordiana, quando a riqueza de uma empresa era seu produto. Se o foco estava na produção de peças, uma boa administração era a que otimizava o tempo, racionalizava as tarefas, diminuía os gastos.

Isto que foi tido como verdade durante décadas, a ponto de se identificar com o próprio capitalismo, não é mais para algumas empresas – nem todas, é verdade – em que o trabalho intelectual é fonte de maior renda. Como a mente não funciona como uma esteira de montagem, não segue um pensamento linear, a lógica da motivação externa (com prêmios ou ameaças) não mais funciona. É fundamental investir na motivação interna, fruto de sentimento de autonomia, excelência e propósito, nas palavras de Daniel Pink.

Para ter equipes criativas e motivadas, é preciso que elas entendam como seu trabalho contribui para o todo, quem é o beneficiário daquilo que elas produzem, por que determinada tarefa deve ser feita. Isto é o propósito: a percepção de que algo tem sentido além de si mesma, ou além da conta a ser paga no final do mês. O ser humano descobriu finalmente que não é mais um “cadáver adiado”, como dizia Fernando Pessoa, mas alguém que é capaz de criar novas realidades, deixar sua marca no mundo, um legado.

Infelizmente, propósito ainda é um luxo para a maioria dos trabalhadores, seja pela facilidade com que eles são trocados pelas empresas, seja pela própria condição do trabalho: qual o propósito de pessoas que trabalham em empresas que não geram valor para a sociedade, apenas a adoecem?

A disputa entre X e Y talvez provoque um equilíbrio entre o feijão e o sonho, o prazer e o esforço. Oxalá a sociedade se renove e se desenvolva com isto.

 

COVEY, Stephen. Liderança baseada em princípios. Rio de Janeiro: Campus, 1994.

PINK, Daniel. Motivação 3.0: os novos fatores motivacionais para a realização pessoal e profissional. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.

*Texto produzido por Mônica Kalil Pires originalmente para o Grupo de Estudos de Liderança da ABRH-RS